Instavida

Para gostar de uma pessoa, precisamos gostar de seus defeitos também? Precisamos aceitá-los e aplaudi-los? Bem, se a resposta for não, sinto-me à vontade para partilhar com você esse texto. Se for sim, pode parar de ler por aqui mesmo, porque certamente você não irá gostar do que vai ler.

A minha implicância do dia se refere às pessoas que eu amo de paixão, mas que me irritam profundamente ao postar todas as suas refeições no Facebook ou Instagram. Não imagino de onde surgiu essa propulsão que as pessoas têm de comer uma coisa bonita, aparentemente gostosa e querer mostrar pra todo mundo o que está comendo! Aliás, hoje, o que não é postado parece que não existiu, né? Fico imaginando como esses meus amigos ficariam tristes se não pudessem postar a comida deles:

-Humm... puxa... Não quero nem comer, perdi a vontade... O Instagram está fora do ar! E agora como vou mostrar pra todo mundo essa batatinha orgânica que fritei no óleo de canola argentino com cubinhos de bacon de javali? Acho melhor colocá-la na geladeira e esperar até o Instagram voltar. - Aí o cara fica com fome o dia todo só esperando o momento de partilhar a sua comida (visualmente, é claro) com o maior número de pessoas possível.

Eu não sou contra postar coisas na Internet. Eu mesma faço isso aos quilos. A minha irritação é saber o passo a passo da vida de uma pessoa. Vamos fazer contas: suponhamos que a pessoa durma sete horas por dia, portanto, restam outras 17 horas para tirar fotos. Ainda bem que, por enquanto, estamos sendo privados das fotos dos banheiros – mas acredito que em breve verei fotos de cocôs no vaso circulando por aí – logo, podemos descontar mais uma hora. São 16 horas disponíveis para postar fotos e dizer “bom dia, boa tarde e boa noite”.

-Bom dia, esposinha linda! – Foto da esposa, sorrindo na cama.
(Ué, não acordaram juntos? Por que dar bom dia pela internet?)
-Café da manhã preparado pelo maridão não tem preço. – Foto de duas xícaras de café e cinco bolachas Mabel.
(Sandro Mabel se casou com você agora?)
-Look do dia – Foto de corpo todo diante do espelho fazendo biquinho.
-Trânsito infernal – Foto do trânsito.
-Bora trampar, né? – Foto do computador.
-Almocinho no Giraffas com minha amiga Fulana de Tal...
-Ainda faltam três horas para encontrar minha linda amiga Beltrana de Tal...
-Relembrando a faculdade, em Frans Café com Beltrana de Tal – Foto das duas abraçadas e em seguida foto do café que estão tomando.
-Academia é só para os fortes. – Segurando o celular na frente do espelho com aquele monte de aparelho atrás.
-Filminho espeeerto, pipoca, sofá e maridão é tudo de bom. – Foto da bacia de pipoca com o pé do marido ao fundo.

Aposto que em algum momento você se identificou com essas legendas. Por favor, quero deixar claro que não tenho nada, absolutamente nada contra as pessoas que fazem isso. Continuam sendo meus amigos do mesmo jeito. Entretanto, me preocupa um pouco a perda da individualidade pela qual estamos passando. Tudo precisa ser publicado. Se não está na internet há sérias dúvidas de que sequer existiu. E a necessidade de se mostrar bem sucedido, vem de onde? O café da manhã mais top, o marido mais gato, o look mais impactante... Perdemos a capacidade de sermos triviais, é isso, Arnaldo?

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